quinta-feira, 7 de novembro de 2019

FLORESTAS SECUNDÁRIAS - PARTE I: DEFINIÇÕES E CARACTERÍSTICAS

Espécie da família Melastomataceae, comum em início de sucessão. Santana, 2009.

Florestas primitivas são manejadas e suprimidas desde os primórdios da civilização humana para diversos fins. Naturalmente, muito do território tomado à custa da supressão florestal se destina a outros usos, como ocupação urbana, agropecuária, exploração mineral. No entanto, parte desta área torna a desenvolver cobertura florestal, que, apesar de não guardar as mesmas características da vegetação original, podem cumprir diversas funções e fornecer benefícios ao ser humano. Estas são as Florestas Secundárias, que, segundo Brown e Lugo (1990), são aquelas criadas após intervenção humana. 

Estima-se que mais de 50% das florestas do mundo sejam secundárias (FRA, 2010). Chazdon (2012) afirma, em extensa revisão sobre o assunto, que as florestas tropicais levam de 100 a 200 anos para recuperar suas características originais, o que, no entanto, poderá ser afetado por novas ações humanas neste decorrer.

Estima-se que a cidade do Rio de Janeiro possui quase 30% de seu território com cobertura florestal. Deste total, 21% são florestas secundárias em diferentes estágios de sucessão (PCRJ, 2015).



Florestas secundárias na cidade do Rio de Janeiro. Acima: Serra de Inhoaíba. Abaixo: Serra de Paciência. Santana, 2012.

A despeito de aumentos episódicos do desmatamento, observa-se ao longo do tempo uma redução das taxas de perda de florestas e  regeneração de florestas secundárias (Chazdon, 2012). Rezende et al (2015) mostram o aumento de mais de 3.000 hectares na cobertura florestal da cidade de Trajano de Moraes (RJ), devido ao esvaziamento da população das áreas rurais e redução das áreas cultivadas. 

Quando comparadas a florestas climácicas, as florestas secundárias possuem menor área basal, distribuição de diâmetros menos variável, ausência de clareiras, lianas lenhosas ausentes e poucas árvores grandes (Finegan, 1996; Guariguata e Ostertag, 2001). Siminski et al (2011) mostra que, em Mata Atlântica, indicadores como riqueza de espécies e diversidade tendem a aumentar com o tempo de sucessão. 

Diversos mecanismos podem interferir nas características das florestas secundárias. Oliveira (2015), discutindo a dimensão humana sobre a sucessão secundária, mostra que o tipo de atividade desenvolvida no território antes da retomada da sucessão é decisiva para formatar a estrutura da floresta por muitos anos, deixando uma assinatura perceptível. O mesmo autor (2002) mostra, em estudo na Ilha Grande, que em florestas resultantes do abandono da agricultura a rebrota de tocos é o primeiro mecanismo de regeneração a atuar no processo de recomposição da biomassa. Essa rebrota é caracterizada pela presença de troncos bifurcados ou multifurcados.

A atividade de remoção de espécies para energia também altera as características da sucessão; áreas exploradas no maciço da Pedra Branca para a produção de carvão tiveram sua diversidade sensivelmente alterada, embora recuperassem sua biomassa e outras funcionalidades de forma eficiente. Uma característica dessas áreas é a predominância de Guarea guidonea, espécie favorecida pela abertura de clareiras e por eventual oferta de água e nutrientes (Oliveira, 2015; Solórzano, Oliveira e Guedes-Bruni, 2005).

Estudos desenvolvidos na Amazônia desde a década de 1980 mostram que o uso anterior da terra condiciona a composição inicial das florestas secundárias. Uhl, Bushbacher e Serrão (1988) mostram que usos mais intensivos, com uso de máquinas e queima, reduzem o banco de sementes e os tocos no solo, retardando a sucessão e favorecendo a dispersão abiótica. Já usos mais leves tendiam a apresentar maior proporção de espécies de dispersão biótica. Em Mata Atlântica, Silva-Matos, Fonseca e Silva-Lima (2005) observaram padrão semelhante em Silva Jardim (RJ), no qual Cecropia domina em áreas sob incêndios frequentes, se mantendo por sua capacidade de rebrota, enquanto Trema se apresenta em áreas sem fogo, sendo uma espécie necessariamente dispersa por sementes.

Norden et al  (2009) mostra que, com o tempo, as florestas secundárias podem alcançar a convergência com a vegetação primeva, atendendo a três premissas locais: alta abundância de espécies generalistas na flora regional, anto nível de dispersão de sementes e a presença de remanescentes de florestas maduras.

Diamond (1975) estabeleceu o conceito das regras de montagem das comunidades, afirmando que a ordem de chegada das espécies do pool regional poderia influenciar a trajetória sucessional. De certa forma, atualizou um conceito anterior, o da Initial Floristic Composition (IFC), de Egler (1956). Sobre o assunto, leia também o artigo de Menezes (2016).

Uma característica das florestas secundárias na região de Mata Atlântica é a presença de grandes exemplares de figueiras (Ficus spp.), poupadas dos ciclos de corte e de produção ao longo do tempo por sua ligação a tradições religiosas cristãs e de matriz africana. Desta forma, acabam por funcionar como espécies-chaves (de acordo com o conceito de Mills, Soulé e Doaks, 1993), atraindo e sustentando a fauna dispersora de sementes, transformando um tabu em elemento de sobrevivência (Oliveira, 2015).


Norden (2015) e Rodrigues (2013) concluem que os processos estocáticos e determinísticos coexistem nas florestas secundárias, sendo mais ou menos proeminentes de acordo com a fase de desenvolvimento - início de sucessão é mais previsível do que o resultado final - e também conforme tamanho e complexidade do remanescente - florestas menores e menos complexas são de maior previsibilidade do que florestas mais extensas e complexas.

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